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Primeiras impressões: MeiaCura editam “Ritual” a 12 de maio

Written by on 10/05/2023

O álbum de estreia dos MeiaCura é habitado por uma eletrónica suculenta que nos convida a dançar sem preconceitos, por um jazz étnico que deriva de uma enorme parafernália de instrumentos (adufes, bombos, gaita de foles, guitarra portuguesa, saxofone, diversos teclados e samplers) e momentos de (auto)reflexão sobre a arte e os seus trilhos quase infinitos. O álbum é lançado no dia 12 de maio. Oito dias depois, a 20 de maio, os MeiaCura apresentam “Ritual” ao vivo no Centro Cultural do Morgado, em Arruda dos Vinhos. No programa Área 51 (23:00 – 02:00), de quinta-feira, vamos escutar o álbum na íntegra.

Apesar de jovens, os multi-instrumentistas MeiaCura – Daniel Constantino (teclas, voz), Tiago Matos (teclas, voz), David Mourão (saxofone, percussão, voz), António Branco (eletrónica, percussão, voz) e João Tojeira (gaita de foles, guitarra portuguesa, percussão, voz) – desenham um disco coeso e que funciona como um livro. Ou seja, podemos retirar capítulos (vulgo singles, “Nascimento”, “Pó No Chão” e, eventualmente, “Ritual”), mas o prazer cada vez mais raro de escutar linearmente um álbum é uma das vitórias desta edição. Tal como quase há 30 anos Beck frisava no intervalo que sucedia ao êxito planetário “Loser” e antecedia “Pay No Mind (Snoozer)” – “This is song two on the album, this is the album right here, burn the album” -, a alertar os incautos que “Mellow Gold” chegara e que nem todos os temas seriam de fácil audição. “Ao saber desta viagem, paira o medo de entrar, são tantos os destinos, vais ter de parar (…)”.

“Vamos fazer um álbum, mas um álbum tem de ter um conceito, não podem ser só músicas soltas. Que conceito é esse? O conceito é MeiaCura. Mas o que é MeiaCura? Tens uma pessoa, essa pessoa tem metade da cura nela. Mas qual metade? O que é que é nela? É um processo de salvação para os males do mundo. Achas-te o salvador? Nós não seríamos a MeiaCura. Estamos só a indicar às pessoas. Olhem! Então isso é uma filosofia, não é uma ideologia. Mas achas que as pessoas vão perceber isso? Quem não perceber não percebe. Isto não é uma cena concreta, é uma cena abstrata. É quase uma religião. Não, é um modo de vida. Vamos para o carro? Eu explico-vos no caminho.” (escuta-se na introdução de “Louca(e)moção”)

Outros momentos do disco – “4_9”, “Folia” e “Li Verdade” – recordam as fases mais exploratórias dos Pop Dell’Arte, Ena Pá 2000, Frank Zappa, Aphex Twin ou Amon Tobin, em tangentes a experiências eletro-acústicas, por vezes de difícil definição. “Ritual” não será certamente para todos os ouvidos. Além dos estudiosos e musicólogos, os MeiaCura parecem acreditar que haverá quem queira deixar os preconceitos à porta e seguir viagem.

Salvaguardadas as devidas diferenças e distâncias, “Ritual” parece continuar o trabalho dos ingleses These New Puritans iniciado nos álbuns “Hidden” (2010) e “Field of Reeds” (2013). O que talvez falte a “Ritual” é a colaboração de uma voz feminina, sobretudo se tiver a candura de Elisa Rodrigues. Ou, quem sabe, de Bia Maria ou Ana Lua Caiano. Sinergias que poderão elevar o patamar na concretização de sonoridades ainda mais preenchidas. Lembremo-nos, como diria Gabriel O Pensador, “ainda é só o começo”.

Classificação: ****/*****

O melhor: Arrojo, inovação e vontade de rasgar fronteiras

O pior: A falta de uma sinergia com uma “heroína” feminina da atualidade