Jean-Luc Godard morre aos 91 anos
Escrito por TunetRádio em 13/09/2022
O cineasta franco-suíço Jean-Luc Godard, um dos principais nomes do cinema desde a estreia de longas-metragens com “O Acossado”, em 1960, morreu, aos 91 anos, avançou hoje o jornal francês Libération, citando fontes próximas.
Parte fundamental da ‘Nouvelle Vague’ francesa, movimento que revolucionou o cinema a partir dos anos 1950, Godard tem uma longa carreira premiada, que vai desde o galardão de melhor realizador, em Berlim, logo por “O Acossado”, até um Óscar honorário, entregue em 2010 numa cerimónia à qual não compareceu.
Autor de obras influentes para várias gerações de realizadores, como “O Desprezo” (1963), com Brigitte Bardot, “Bando à Parte” (1964), “Pedro, o Louco” (1965) ou os mais recentes “Filme Socialismo” (2010) e “Adeus à Linguagem” (2014), Jean-Luc Godard ficou conhecido “pelo seu estilo de filmar iconoclasta, aparentemente improvisado, bem como pelo seu inflexível radicalismo”, como recorda o jornal The Guardian no obituário do cineasta.
Realizadores como o norte-americano Quentin Tarantino, que chegou a ser cofundador de uma produtora intitulada “Bando à Parte”, referiram-se a Godard como um “libertador”: “Para mim, Godard fez aos filmes aquilo que Bob Dylan fez à música. Ambos revolucionaram as suas formas”, disse Tarantino, numa entrevista de 1994 com a Film Comment.
Controverso em termos políticos e artísticos, a sua obra estava longe de consensual no meio: por exemplo, Paula Rego detestava o seu trabalho e Ingmar Bergman dizia-se incapaz de compreender os seus filmes, uma vez que os considerava “feitos para críticos”.
O texto do Libération sobre Godard abre com uma citação do português Manoel de Oliveira (1908-2015), com quem Godard dialogava em abundância, que dizia que o cinema do autor de “O Maoista” “é a saturação de signos magníficos que se banham à luz da sua falta de explicação”.
Nascido em Paris, em 1930, Godard passou os primeiros anos da sua formação na Suíça, tendo estudado Etnologia na Sorbonne, em Paris, onde “conversas de café com estudantes e um trabalho manual numa barragem” constituíram grande parte da sua aprendizagem, que inspirou a primeira curta-metragem, “Opération Béton”, de 1954, lembra a biografia disponível na Enciclopédia Britânica.
Os estudos em Etnologia vieram a entroncar no trabalho de Jean Rouch, que estava precisamente a misturar a área da antropologia com o cinema num estilo designado ‘cinema vérite’. “Ele começou a escrever sobre os filmes que via na [revista] ‘Cahiers du Cinema’ e formou alianças com artistas que se tornariam no núcleo da Nova Vaga francesa. Embora moldada a partir dos filmes de ‘gangsters’ de Hollywood, a estreia de Godard, ‘O Acossado’, desafiou as convenções do cinema e espantou críticos, cineastas e públicos com o seu estilo de improviso, trabalho de câmara ‘handheld’ impulsivo e saltos intencionais”, pode ler-se na biografia disponível na página da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
Godard esteve na criação de um coletivo intitulado Dziga Vertov, que, mais do que produzir “filmes políticos”, radicais em termos estéticos, tinha o propósito de “fazer filmes politicamente”, o que impunha a perspetiva em “todo o processo”, da produção à rodagem, citava a Cinemateca Portuguesa, na apresentação de um ciclo sobre o grupo, em 2018.
As reações à morte de Godard não se fizeram esperar: o britânico Edgar Wright escreveu, no Twitter, que, apesar de iconoclasta, o realizador “reverenciava o sistema de Hollywood, já que, provavelmente, nenhum outro cineasta inspirou tantas pessoas a pegar numa câmara e começar a filmar”. A Cinemateca Francesa lembrou Godard através de uma frase: “O cinema não está ao abrigo do tempo. Ele é o abrigo do tempo”.
Dentro e fora do cinema lamenta-se a morte do cineasta Jean-Luc Godard
Cineasta genial, que reinventou o cinema e foi figura tutelar da sua geração, é assim que o cineasta franco-suíço Jean-Luc Godard, que morreu hoje aos 91 anos, foi recordado por figuras e personalidades dentro e fora do cinema.
Na rede social Twitter, o Presidente francês, Emmanuel Macron, descreveu Jean-Luc Godard como “o mais iconoclasta dos realizadores da ‘Nouvelle Vague’, que inventou uma arte corajosamente moderna e intensamente livre”, acrescentando que se perdeu “um tesouro nacional, um olhar de génio”.
Também no Twitter, a atriz francesa Brigitte Bardot, que protagonizou “O desprezo” (1963), escreveu que Godard se juntou “ao firmamento dos últimos grandes criadores de estrelas”, enquanto o antigo diretor da revista ‘Cahiers du Cinéma’, Jean-Michel Frodon, lembrou que “foi a estrela da sua geração”.
Godard atingiu o mundo “com uma onda de audácia, liberdade e irreverência”, escreveu a ministra francesa da Cultura, Rima Abdul Malak, e a Cinemateca Francesa recordou o cineasta através de uma frase: “O cinema não está ao abrigo do tempo. Ele é o abrigo do tempo”.
Para o ator franco-suíço Alain Delon, a morte do cineasta representa um virar de página na História do cinema, como afirmou à agência France-Presse. O realizador brasileiro Kléber Medonça Filho, o britânico Edgar Wright e o mexicano Guillermo del Toro também se juntaram ao coro de lamento pela morte do realizador, assim como os realizadores portugueses João Rui Guerra da Mata e Gonçalo Tocha ou o produtor e exibidor Pedro Borges.
“Jean-Luc Godard é o Picasso do cinema”, afirmou o antigo presidente do festival de Cannes Gilles Jacob, à AFP, considerando que o cinema mundial ficou órfão. Parte fundamental da ‘Nouvelle Vague’ francesa, movimento que revolucionou o cinema a partir dos anos 1950, Jean-Luc Godard morreu hoje em casa em Rolle, na Suíça, revelou a família em comunicado citado pela AFP.