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Novo álbum de Charraz a ouvir “como quem lê um romance”

Escrito por em 01/02/2021

O musico Rogério Charraz defende que o seu novo álbum, “O Coreto”, a editar no próximo dia 26, deve ser “escutado como quem lê um romance”, seguindo-se mesmo o texto das canções e a introdução a cada uma.

“Este trabalho, para ser entendido na sua totalidade, precisa que as pessoas vão olhando para o ‘booklet’, lendo a introdução que colocámos em cada canção, explicando o seu papel na história”, disse Charraz ao jornalista Nuno Lopes, da Lusa.

“Nada impede”, porém, “que cada canção tenha por si só uma vida própria”, alertou, por seu turno, o autor de todas as letras deste álbum, José Fialho Gouveia. Os dois criadores de “O Coreto” falam sobre este novo projeto “totalmente concebido em parceria”, como sublinha Charraz: “José Fialho Gouveia participou em tudo, desde a gravação à conceção da capa”.

O álbum conta com a participação da cantora Sara Cruz, que Charraz descobriu nos Açores e que afirma ter “a voz perfeita” para Ana, a personagem feminina desta história. O músico destaca “a fragilidade” como Sara Cruz interpretou as canções.

Entre outras canções, Sara Cruz interpreta, em duo, “Feita deste Chão” e “Vou Estar Aqui”, o último capítulo desta história. Sobre o CD, Charraz disse que “é um projeto muito a dois, não só na parte criativa, pois o José Fialho [Gouveia] fez parte de todo o processo, até em estúdio”, sublinhando “a enorme cumplicidade”, entre ambos.

“Tem sido muito fácil. E poucos são os momentos em que discordamos. Temos a mesma idade, temos ideias muito semelhantes do ponto de vista político, somos do mesmo clube, temos os mesmos gostos musicais e literários”, prosseguiu Charraz, que referiu que “a presença ‘do Zé’ foi uma enorme mais valia” e “facilitou o trabalho”.

A colaboração entre ambos já tivera início no álbum “Não Tenhas Medo do Escuro” (2016), para o qual Fialho Gouveia escrevera cinco letras, e continuou em “4.0” (2018), com quatro temas. “Começámos logo a trabalhar muito juntos”, afirmou Charraz realçando que “as palavras [de Fialho Gouveia] são muito simples, pois são muito sugestivas”.

Charraz, que referiu que cada vez escreve menos, salientou ainda que, com José Fialho Gouveia passou a ter alguém com “quem partilhar decisões e trocar ideias desde o ponto de vista estético até ao negócio”. Uma situação que contrasta com os anteriores álbuns em que, reconheceu, trabalhou “muito sozinho”. “Nesse sentido”, o letrista aliviou-o bastante, garantiu.

José Fialho Gouveia, por seu lado, sublinhou “a grande empatia e amizade” que une os dois, e “a forma de ver o mundo”, o que “facilita o trabalho”. Na opinião do letrista, a interpretação de Rogério Charraz “é uma certeza que vai estar de acordo” com o que escreveu.

“Quando escrevo uma letra qualquer, ou o Rogério vai dar exatamente a intenção que eu queria àquelas palavras, ou vai melhorá-las”, sublinhou Fialho Gouveia à Lusa, acrescentando que funcionam “muito bem” juntos.

No processo de construção das canções, habitualmente, primeiro Fialho Gouveia escreve a letra, seguindo-se a composição musical de Charraz. Rogério Charraz disse que o objeto “coreto” o fascinava há já alguns anos. Passou assim a Fialho Gouveia a ideia de “uma história em que o coreto tivesse um papel central”, que fosse um tributo a um equipamento que “é lindíssimo, muito pouco valorizado, quase sempre decorativo, mas muito bem situado, central e em sítios lindíssimos”.

O seu principal objetivo “é tocar em coretos, como aconteceu em agosto do ano passado, em Pinhal Novo, no concelho de Palmela [distrito de Setúbal] e que funcionou maravilhosamente”, disse.
O coreto “é um palco lindíssimo e, do ponto de vista cénico, permite jogar com as luzes e o espaço envolvente”, disse o músico.

Para José Fialho Gouveia, que já escreveu para outros intérpretes como o fadista Hélder Moutinho, a diferença em relação a Charraz “é mais de temática, de assuntos que são abordados e como o são”. “As coisas não são estanques”, declarou Fialho Gouveia, referindo que “já aconteceu estar a escrever e a imaginar um fado, mas o Rogério pegou na letra e virou tudo menos fado”.

Todavia, quando escreve para Rogério Charraz, o letrista reconhece que já tem a voz dele na cabeça e “o [seu] registo de composição”. “Ao escrever uma letra, independentemente para quem seja, tenho a tendência a imaginar uma voz ou até tenho uma melodia na cabeça, mas quando escrevo para o Rogério, isso simplifica-se e torna-se um processo simples, cómodo, confortável”, referiu Fialho Gouveia.

Rogério Charraz defendeu que, neste CD, mantém a sua “crítica social”, designadamente “a um país assimétrico, centrado em três ou quatro núcleos urbanos, e um outro país sem hospitais ou postos dos correios, onde não há outros serviços essenciais”

Reconhecendo que, neste álbum, “não há uma crítica política, como aconteceu em ‘O Submarino Irrevogável'”, do álbum “Espelho” (2014), Charraz argumentou que “não fazia sentido ter essa linguagem tão direta”.

“Neste CD, não fazia sentido ter essa linguagem tão direta e objetiva sobre questões políticas, mas a crítica social está lá e, mais do que a crítica, a preocupação social, nomeadamente este país assimétrico que nos impede de sermos felizes”, afirmou Charraz.

Sobre o CD, destacou os “excecionais músicos” que o acompanham, entre os quais Carlos Miguel, na bateria e percussão, Nuno Oliveira, no contrabaixo, Mário Delgado, na guitarra ‘Dobro’, Paulo Gaspar, no clarinete e saxofone barítono, e Carlos Lopes, no acordeão. Rogério Charraz acompanha-se na guitarra acústica.

“O Coreto” deverá ser apresentado no Teatro da Trindade, em Lisboa, no dia 23 de março, “respeitando todas as regras de segurança e com algumas surpresas”. Entre as participações previstas, estão Luísa Sobral, que entra nos coros de “O Coreto” e foi a responsável pela produção musical.

Rogério Charraz e José Fialho Gouveia justificaram a escolha de Luísa Sobral para a produção, pela sua “abordagem acústica, que vai ao osso da canção” e a respeita, “sem artefactos artificiais”.

Charraz reconheceu que a atual pandemia o levou a cancelar concertos, embora tivesse conseguido manter alguns: em Ponte de Lima, Viana do Castelo, em julho, outro no Pinhal Novo, em agosto, e outro, em setembro, na Festa do Avante!, no Seixal, também no distrito de Setúbal.

Fez ainda “algumas coisas pequenas”, em termos de atuações, mas agora “o futuro é uma incógnita”, até porque alguns concertos de outros artistas foram adiados e “têm de ser encaixados logo que a situação se normalizar”.

“O Coreto”, de Rogério Charraz com letras de José Fialho Gouveia, tem capa da autoria de Camila Beirão dos Reis, que também assina as ilustrações e o ‘layout’. O álbum chega aos escaparates no próximo dia 26, e deverá subir ao palco do Teatro da Trindade, em Lisboa, no dia 23 de março.